As economias mundiais e do Brasil têm passado por ciclos econômicos semelhantes desde o advento da pandemia da covid-19. O cenário atual é de um ambiente econômico um pouco melhor do que o esperado. A maior parte das economias está crescendo, mesmo que a taxas baixas e em decorrência dos resquícios dos pacotes emergenciais adotados pelos governos, e o desemprego está relativamente controlado. No Brasil, os gastos públicos em níveis elevados restringem o espaço para cortes dos juros. Apesar da desaceleração da inflação nos últimos meses, as expectativas dos agentes econômicos demandam cautela para novos cortes na meta da taxa Selic.
Esse panorama foi apresentado, nessa quarta-feira (15), na palestra Análise macroeconômica atual: Brasil e mundo, promovida pela CNT (Confederação Nacional do Transporte) para representantes do setor transportador. A exposição ficou a cargo do especialista em análise macroeconômica da LCA Consultores Mauro Schneider.
Com experiência em análise macroeconômica voltada para o suporte à identificação de oportunidades de investimentos e à gestão de riscos, Schneider remeteu o começo desses ciclos à redução da demanda no início da covid-19, em 2020, que levou à forte queda da inflação e dos juros. A partir da reabertura dos negócios, houve o choque de oferta e alta da inflação e da taxa de juros, fenômenos intensificados pelo conflito entre Rússia e Ucrânia.
“A superação desse quadro ocorreu, em parte, impulsionada pela transferência de recursos emergenciais dos governos para as famílias e com os gastos públicos aumentados, mas isso diminuiu o espaço de redução de juros, que continua subindo e que em alguns lugares está demorando para cair”, pondera.
Nos Estados Unidos, deve haver crescimento baixo com o fim da poupança extra e os efeitos defasados do aumento de juros, pois o PIB (Produto Interno Bruto) continua a crescer em ritmo “normal”. O mercado de trabalho também segue aquecido, com expansão contínua do número de adultos trabalhando (quase 2% ao ano) e com o salário médio e a massa salarial crescendo 4% e 6%, respectivamente. A taxa de desemprego também está em nível historicamente baixo, inferior a 4%.
A expectativa é a de que, daqui em diante, a economia cresça um pouco menos e as taxas de juros fiquem mais baixas. Movimento parecido ocorre na China e na Europa. Schneider chama essa combinação de “cenário neutro” e compensatório. “Isso é bom para todo mundo porque diminui o custo de crédito de forma geral e tende a ser relativamente neutro para o Brasil e outros países da região”, ressalta.
PIB do Brasil parou de crescer no terceiro trimestre de 2023
Após forte expansão do setor agropecuário no primeiro semestre de 2023, o PIB do Brasil parou de crescer. Nos dois últimos trimestres do ano, o desempenho da economia brasileira foi muito próximo de zero, apesar de um crescimento mais estável do PIB da indústria e de serviços. No Brasil, a taxa de desemprego está relativamente baixa em termos históricos, pouco acima de 7%, a despeito da manutenção das taxas de juros em nível elevado. Além disso, a massa de renda total, que considera a renda do trabalho, da seguridade e da assistência social, tem crescido mais do que crescia antes da pandemia.
O mercado de crédito brasileiro tem perspectivas de melhora, já que a queda gradual da inadimplência abre espaço para o crescimento um pouco mais acelerado da oferta de crédito livre. O sinal de alerta é para a inflação, cujas projeções dos analistas para 2024, 2025 e 2026 é de que ela permaneça distante da meta de 3,0%. “Apesar de a inflação seguir em nível relativamente alto, a de preços livres tem estado próxima da meta há vários meses”, pondera Schneider.
Na avaliação do especialista, de uma forma geral, a economia brasileira vai bem. No entanto, o governo tem dificuldades para cortar despesas e elevar receitas, o que levou a uma revisão na estratégia de melhora das contas públicas e adiamento na meta de se alcançar superávit primário para 2026. “Essas mudanças geram incerteza e reduzem a credibilidade da política fiscal”, analisa o economista.
Impacto da tragédia no RS
Segundo Mauro Schneider, ainda é cedo para mensurar o tamanho dos impactos econômicos decorrentes das enchentes no Rio Grande do Sul (RS) para o Brasil e para o próprio estado. Schneider pontua que, em relação ao PIB nacional, os dados do IBGE de 2021 dão conta de que a participação do RS na soma total de todos os bens e serviços finais produzidos (PIB do estado) corresponde a cerca de 6,5% do PIB nacional.
Ao detalhar esse percentual por setores, destacam-se o da agropecuária (1%), o da indústria (1,6%) e o dos serviços do estado (4%). “É difícil projetar o impacto das enchentes sobre as variáveis macroeconômicas, como PIB e inflação, nesse momento. É preciso levar em conta que, em termos de produção, o impacto de maio pode ser compensado ao longo desse ano e do próximo, a depender da capacidade de recuperação da economia. O PIB, por exemplo, não captura a perda de estoque de capital da economia gaúcha, mas os investimentos realizados serão contabilizados ao longo dos próximos anos”, pondera.
Fonte: Agência CNT Transporte Atual