Em 12/05/2021 foi publicada a Lei 14.151 que entra em vigor na data de sua publicação e dispõe sobre o afastamento da empregada gestante das atividades de trabalho presencial durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus.

Trata-se de uma lei com apenas dois artigos e um parágrafo, mas não esclarece aspectos fundamentais para a sua aplicação.

Não se ignora a necessidade de preservação da saúde da gestante e do nascituro, inclusive no ambiente de trabalho. Neste sentido existem várias garantias legais, tais como a garantia de emprego prevista na Constituição Federal (art.10, II, “b”, ADCT) e os dispositivos da CLT que protegem a maternidade (arts.391 a 400).

A nova Lei traz agora mais um benefício à empregada gestante que é o seu afastamento do trabalho presencial, sem prejuízo da remuneração, durante a pandemia decorrente da Covid-19.

Dispõe o artigo 1º da nova lei que durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração.

O parágrafo único do mesmo artigo estabelece que a empregada afastada ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicilio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância.

Em primeiro lugar, vale ressaltar que a nova lei não faz menção ao estado de calamidade pública que foi declarado pelo Decreto Legislativo 06, de 20/03/2020, que vigeu até 31/12/2020 e que não foi prorrogado a despeito da pandemia da Covid-19 ter continuado e, inclusive, ter se agravado no início de 2021.

Tendo em vista que a lei dispõe sobre o período de emergência de saúde pública decorrente do novo coronavírus, temos que a mesma está em vigor a partir de sua publicação, não estando condicionada a eventual prorrogação do estado de calamidade pública.

Vale destacar que a Lei 13.979, de 06/02/2020, que também surtiu efeitos até 31/12/2020, em função do artigo 8º que condicionou a sua vigência a do Decreto Legislativo 06/20, dispunha sobre as medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus, dispondo em seu artigo 3º, que as autoridades poderiam adotar, no âmbito de suas competências, várias medidas elencadas nos incisos I a VIII, tais como: isolamento, quarentena, restrição à locomoção, uso de máscaras, exames médicos, testes laboratoriais, coleta de amostras clinicas, vacinação, investigação epidemiológica, dentre outras.

Em dezembro de 2020 o ministro Lewandowski do STF, através de decisão monocrática na Ação Direta de Inconstitucionalidade 6.625, posteriormente confirmada em plenário virtual, prorrogou a vigência de medidas sanitárias, mesmo com o fim do estado de calamidade pública, ocorrido em 31/12/2020, autorizando a realização das medidas contidas na Lei 13.979/20, inclusive isolamento e quarentena.

Há dois problemas de ordem prática na Lei 14.151/21 diante da sua má redação.

O primeiro é ausência de um prazo final para o afastamento da gestante do trabalho presencial, na medida em que a referida lei apenas menciona durante a emergência de saúde pública.

Para que o referido afastamento não fique sem prazo definido será necessária uma outra norma legal que declare o término do período de emergência de saúde pública se e quando o mesmo ocorrer.

O segundo problema é o fato de a lei não se preocupar com algumas funções onde a empregada gestante não pode desenvolver as suas atividades em seu domicilio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância.

Nestes casos, estará sendo assegurado à gestante um afastamento sem trabalho e com remuneração às expensas do empregador, encargo juridicamente questionável, pois exige o pagamento de salário sem a contraprestação dos serviços.

Caso a empregada gestante passe a exercer as suas atividades em seu domicilio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância, recomendamos que seja formalizado um aditivo ao contrato de trabalho, especificando as atividades que serão realizadas, responsabilização pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do trabalho remoto e eventual reembolso de despesas, desde que ajustado entre as partes, nos termos dos artigos 75-C e 75-D da CLT.

Também deve ser observado pelo empregador o disposto no artigo 75-E da CLT no sentido de instruir a empregada gestante, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças, acidentes do trabalho ou outras circunstâncias que possam prejudicar a sua gravidez, devendo a colaboradora assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.

Esperamos que a referida lei possa ser regulamentada através de Decreto para que as suas lacunas possam ser supridas.

Por fim, lamentamos que uma legislação que vise beneficiar a gestante tenha uma redação tão singela e incompleta que pode gerar mais insegurança jurídica do que proteção social.

Narciso Figueirôa Junior é assessor jurídico da FETCESP